21/06/2019
LIKE A ROLLING STONE
Abaixo a foto do lugar onde passei um bom tempo isolado, em paz, assistindo o mundo passar. Lembrei da pergunta que o Bob Dylan faz em uma de suas canções mais icônicas: “Como se sente isso? Passar um tempo consigo mesmo, sem rumo pra casa, como um completo desconhecido, como uma pedra rolando?”.
Descobri que meu modo de vida cabe num refrão. Mais do que isso, durante todo esse tempo isolado, me pus a pensar sobre “o que é a vida”, e cheguei a uma conclusão assustadoramente próxima desse cenário.
Eis a pergunta que me ocupa a mente: o que é a vida?
Cada vez mais me convenço de que o conhecimento é construído mais com perguntas do que com respostas. As perguntas abrem caminhos, que algumas vezes até geram respostas. Me dou conta de que nem todas as perguntas continuam sem respostas, apenas as melhores.
Se a resposta deixou de ser o objetivo final, me dei ao luxo de formular perguntas cada vez mais difíceis, tenho tempo, interessado principalmente no caminho até o mais próximo que eu poderia chegar da verdade, por mais longe que eu inevitavelmente estivesse. Me dei conta de que antes precisaria antes entender “o que é a verdade”, razão que me consumiu alguns dias ininterruptos de pensamento constante. Classifico aqui “verdade” como uma aproximação factual, mais próxima conforme o volume de evidências, experiências, pontos de vista diferentes e repetição em diferentes cenários. Não faço ideia se isto está teoricamente correto, foi apenas a conclusão que cheguei por mim mesmo, preferi deixar o pensamento livre, ainda que mais passível de erros. Como primeira lição, descobri que as melhores perguntas geram mais perguntas.
Pois bem, o que é a vida? Para mim, a vida é uma pedra rolando. Inevitável, cíclica, imparável e constante. A partir disso, foi possível agregar novos fatores e submetê-los ao mesmo conceito, com sucesso moderado até aqui.
Inicialmente, explicar a pedra que rola torna-se uma necessidade para além da pedra em si, mas insistimos. A filosofia escolhe o ângulo a ser observado, algumas vezes desde o sentido amplo que ganha detalhes, outras vezes no caminho contrário. Há que pergunte o que é a pedra, por que ela rola, para onde, o que a move. Algumas perguntas se tornam tão complexas que geram subdivisões, tão consistentes que geram áreas separadas de estudo. Há os mecanismos da pedra que rola: inércia, gravidade, direção, atrito, massa e etc. Há os elementos da pedra, do ar e do solo, um mundo desde a partícula até o conjunto. Cada área aborda um microcosmo, é fascinante ver a interação final de todos ângulos analisados.
Há ainda algo intrigante, uma pequena parte do cenário. O que seria então a nossa vida?
Para mim, seria a viagem que ocorre entre o solo, um ciclo em parábola sobre a pedra que rola, depois o solo outra vez. Difícil entender a pedra que rola enquanto por ela navegamos, portanto. Neste tão breve círculo, alguns tentam descobrir o máximo possível sobre a pedra que rola, registram o avanço, para que outros o refutem ou construam algo sobre isso. Eis um possível papel da ciência.
Pois bem, qual é o papel que escolhi desempenhar então?
Outra vez, entrei em um looping, que deixou o restante do conceito mais impreciso. Eu teria que pensar mais profundamente sobre “o que é escolha”, se ela existe e como existe. Com o risco da imprecisão aumentada, apenas me atenho a um único quadro da pedra que rola, para simplesmente analisar o que vejo.
Decidi me mover pela pedra enquanto a pedra se move. Cada centímetro em qualquer direção me revela algo novo, cada conversa, cada ponto de vista, cada livro, cada música, cada silêncio. Se há uma razão principal que me mantem vivo, a resposta me parece óbvia: a curiosidade. Não tenho a empáfia de querer interferir na pedra que rola. Ainda assim, percebo a capacidade de interferir no mínimo espaço que me cerca enquanto a pedra rola.
Conceito inicial formulado, resta uma dúvida posterior. Pois bem, comecei com uma dúvida e terminei com outras 7 até aqui. Em um terreno fértil, a dúvida se reproduz com velocidade fascinante, mas deixa frutos no processo. Se a vida é a pedra que rola, se nossa vida é parábola do solo ao solo, o que somos nós?
Neste sentido, somos todos pedronautas. “Like a rolling stone”.