19/11/2023
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MONUMENTO A ZUMBI DOS PALMARES | RIO DE JANEIRO
O mês de novembro traz junto com ele a comemoração no Brasil do Dia da Consciência Negra (20), quando diversas cidades do país celebram a data e a época com uma especial programação cultural, de debates e de ações afirmativas para conscientizar a população brasileira da importância dos povos de origem africana na formação da nação, bem como o momento para marcar a representação da contínua luta e resistência contra as muitas formas e manifestações da prática do racismo, infelizmente, recorrentes no país.
O 20 DE NOVEMBRO
O Dia Nacional da Consciência Negra é celebrado desde 2003, mas foi oficializado por lei federal apenas em 2011. A data passou a integrar o calendário de feriados de alguns estados, como o Rio de Janeiro, Alagoas, Amazonas, Amapá e Mato Grosso. Em outros estados, a responsabilidade é do prefeito de decidir sobre o feriado no município.
A origem da celebração no dia 20 de novembro remonta ao ano de 1971, quando uma minuciosa pesquisa realizada no Rio Grande do Sul apurou a data do assassinato de Zumbi, governante da famosa República de Palmares – um dos maiores e mais importantes quilombos do período colonial brasileiro. A data de sua morte, descoberta por historiadores, motivou os membros do Movimento Negro Unificado de aproveitá-lo em sua luta contra a discriminação racial, em um congresso realizado em 1978, ainda no contexto da Ditadura Militar. Elegeram ali a figura de Zumbi como um símbolo da luta e da resistência dos negros escravizados no Brasil, bem como da luta por direitos de todo descendente da enorme população africana trazida à força.
CONTEXTO SOCIAL E POLÍTICO
Com a redemocratização do Brasil e a promulgação da Constituição de 1988, vários segmentos da sociedade, os movimentos sociais, como o Movimento Negro, obtiveram um maior espaço no âmbito das discussões e decisões políticas. A lei de preconceito de raça ou cor (7.716, de 5 de janeiro de 1989) e leis como de cotas raciais no âmbito da educação superior, e, especificamente na área da educação básica [lei 10.639, de 2003, que instituiu a obrigatoriedade do ensino de História e Cultura Afro-brasileira], são exemplos de legislações que traz devida reparação aos danos sofridos pela população negra na história brasileira.
A figura de Zumbi dos Palmares é especialmente reivindicada pelo movimento negro como símbolo do movimento. A lei que instituiu o dia da Consciência Negra foi também fruto da reivindicação e recuperação de sua presença na história nacional. Zumbi é, inclusive, sugerido no texto das Diretrizes Curriculares Nacionais para Educação das Relações Étnico-Raciais e Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana como personalidade a ser abordada nas aulas de ensino básico como exemplo da luta dos negros. A sugestão se orienta por determinação da lei 10.639, artigo 26-A, parágrafo 1º, onde se lê: “O conteúdo programático a que se refere o caput deste artigo incluirá o estudo da História da África e dos Africanos, a luta dos negros no Brasil, a cultura negra brasileira e o negro na formação da sociedade nacional, resgatando a contribuição do povo negro nas áreas social, econômica e política pertinentes à História do Brasil”.
DISCUSSÃO
Mas a razão da comemoração do Dia da Consciência Negra ser no dia da morte de Zumbi também gera polêmica, principalmente no âmbito acadêmico. Os primeiros escritores e as primeiras obras a abordar o fato histórico, como os de Edison Carneiro (O Quilombo dos Palmares,1966), Eduardo Fonseca Jr. (Zumbi dos Palmares, A História do Brasil que não foi Contada, 1988) e Décio Freitas (Palmares, a Guerra dos Escravos, 1973), abriram caminho para a compreensão da história da fundação, apogeu e a queda do Quilombo dos Palmares, mas, em certa medida, deram também espaço para a visão política do homem e da figura de Zumbi, o que, segundo outros historiadores que revisaram esse acontecimento, pode ter sido prejudicial para a causa.
Atualmente um dos principais historiadores que estudam e revisam a farta história do Quilombo dos Palmares é Flávio dos Santos Gomes, cuja principal obra é "De olho em Zumbi dos Palmares: História, símbolos e memória social" (2011). Gomes procurou na obra realizar não apenas uma revisão dos fatos a partir do contato direto com fontes do século XVI e XVII, mas também analisar a imagem iconográfica de Zumbi. Segundo esse autor, o tio de Zumbi, o governante Ganga Zumba, que chefiou o quilombo e, inclusive, firmou tratados de paz com as autoridades locais, acabou tendo sua imagem diminuída e pouco conhecida em razão da escolha ideológica de Zumbi como um símbolo de luta.
HISTÓRIA
Mas quem foi Zumbi dos Palmares? Ele nasceu no que é hoje o estado de Alagoas [antes, da Capitania de Pernambuco] no ano de 1655. Embora nascido livre, foi posto como cativo por volta dos sete anos. Entregue ao padre católico Antônio Melo, que o batizou de Francisco, ele recebeu além do batismo, o ensino da língua portuguesa, do latim, da álgebra e principalmente de religião, chegando a ajudar a celebração das missas. Porém, aos 15 anos decidiu fugir de Porto Calvo para viver no quilombo dos Palmares. No quilombo, na comunidade, deixou de ser o Francisco para ser chamado de Zumbi (cujo o significado é algo similar a “aquele que estava morto”, que “aquele que reviveu”, no dialeto imbagala de Angola).
Em 1675, o quilombo foi atacado por soldados portugueses. Zumbi atuou na defesa e se destacou no campo de batalha como um guerreiro determinado e feroz. Após a batalha sangrenta, os portugueses foram obrigados a se retirar para Recife. Três anos depois, o governador da província de Pernambuco ofereceu ao líder Ganga Zumba um acordo. Zumbi discordou.
Revoltado com a assinatura da paz, Zumbi rompeu com Ganga Zumba. Seguiu-se um período de extrema conturbação na comunidade quilombola. É dito que nessa confusão, Ganga Zumba foi envenenado por um seguidor de Zumbi. Com a vacância da liderança, Zumbi foi então foi aclamado Grande Chefe. Nessa época, o quilombo de Palmares tinha como capital o Macaco, na Serra da Barriga, e possuía cerca de 1.500 casas, campos de cultivo, infraestrutura básica e uma população estimada de mais de 8 mil pessoas.
A Coroa tinha dado a ordem de acabar com o quilombo. Para destruí-lo, o poder colonial organizou 16 expedições oficiais. Quinze fracassaram devido à região montanhosa e às estratégias militares dos negros, habilidosos na luta, embora carentes de armas. A expedição vitoriosa ficou a cargo de Domingos Jorge Velho, um bandeirante paulista treinado na caça aos índios. Ele comandou um exército de 2 mil homens, armados de arcos, flechas e espingardas.
Na sangrenta luta que ocorreu, Zumbi acabou baleado, mas conseguiu realizar uma fuga, dita, espetacular. Um ano depois reapareceu e com cerca de 2 mil palmarinos voltou a atacar povoados em Pernambuco, especialmente para conseguir armas e munições. No entanto, em um dos ataques, um de seus grupos foi derrotado, e o seu comandante, Antônio Soares foi preso. Após ser torturado pelo bandeirante e mercenário paulista André Furtado de Mendonça, a ele foi oferecida a liberdade em troca da revelação do esconderijo de Zumbi.
Em 20 de novembro de 1695, Soares levou Mendonça até o esconderijo de Zumbi, na Serra Dois Irmãos. É contado que, ao ver Soares, Zumbi, o grande chefe dos revoltosos, foi abraçá-lo, mas foi recebido com uma punhalada no estômago. Os paulistas atacaram e o rebeldes foram mortos. O corpo de Zumbi foi perfurado por balas e mais punhaladas, e levado a Porto Calvo, onde foi decapitado e sua cabeça enviada para Recife. Por ordem do governador, ela foi espetada em um poste para a exposição pública “até a total decomposição”.
O resgate dessa história no século XX, elevou Zumbi a categoria de um dos grandes líderes e mártires de nossa história. E apesar de polêmicas e divergências, Zumbi é hoje um símbolo autêntico da resistência e luta contra a escravidão, e também da liberdade de culto, religião e pratica da cultura africana, como de todas as principais reivindicações de direitos da vasta presença, relevância e influência dos afros descendentes no Brasil.
Fonte: História do Brasil [Boris Fausto], Brasil Escola [Claudio Fernandes] e Wikipedia.
Foto: Murillo Sant'Iago